Na era da hiperconectividade, o celular se transformou em uma extensão do corpo. Ele nos acorda, nos embala com podcasts noturnos e nos conecta até os últimos segundos antes do sono. Mas, entre a praticidade e o conforto, há um risco silencioso que se esconde nas luzes, vibrações e na proximidade do aparelho à nossa cabeça durante o repouso.
Qualidade do sono: o segredo para uma vida mais saudável e equilibrada
Dormir com o celular na cama ou ao lado do travesseiro pode parecer inofensivo. No entanto, estudos apontam que esse comportamento compromete a qualidade do sono, favorece a ansiedade, dificulta a indução ao sono profundo e, em casos mais extremos, pode até causar acidentes domésticos. Ainda que a ciência não confirme todos os temores populares, os impactos indiretos do uso noturno do celular são significativos.
Radiação não ionizante: preocupação antiga, evidência limitada
Muitas pessoas temem que a radiação emitida pelos celulares cause câncer ou afete o cérebro. É importante esclarecer que os celulares emitem radiação de radiofrequência classificada como não ionizante, ou seja, sem energia suficiente para alterar o DNA ou danificar células.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica esse tipo de radiação como possivelmente carcinogênica, mas estudos de grande escala não encontraram uma ligação conclusiva entre o uso do celular e o desenvolvimento de tumores cerebrais. Mesmo assim, a recomendação geral é limitar o contato prolongado com o aparelho, especialmente em momentos de descanso.
Luz azul: como isso afeta o seu sono?
Muito mais prejudicial que a radiação é a exposição à luz azul emitida pelas telas. Essa luz interfere na produção de melatonina, o hormônio que prepara o corpo para dormir. Quando você olha para o celular à noite, seu cérebro interpreta que ainda é dia, o que atrasa o sono e diminui o tempo total de repouso profundo.

Além da luz, há o conteúdo: mensagens, vídeos e redes sociais estimulam o sistema nervoso e dificultam o relaxamento necessário para dormir. Mesmo sons e vibrações sutis mantêm o corpo em estado de alerta, fragmentando o sono e comprometendo sua qualidade.
Ansiedade digital e a mente que não desliga
A sensação de estar sempre disponível, o medo de perder algo importante (FOMO — fear of missing out) e a necessidade constante de checar notificações alimentam um estado de ansiedade contínua. Estudos associam o uso noturno do celular ao aumento de sintomas depressivos, irritabilidade, lapsos de memória e menor rendimento no dia seguinte.
Esse ciclo também contribui para distúrbios do sono como insônia e nomofobia — medo irracional de ficar sem o celular. O vício em telas pode impedir que o cérebro entre em estado de repouso profundo, impactando diretamente a saúde mental, o desempenho profissional e até o controle de doenças como diabetes e hipertensão.
Superaquecimento e acidentes reais
Embora menos frequentes, os riscos técnicos não devem ser ignorados. Carregar o celular na cama, sob o travesseiro ou próximo de materiais inflamáveis pode causar superaquecimento, danificar a bateria e, em casos extremos, provocar incêndios.
Quando o aparelho está carregando, gera calor que precisa ser dissipado. Ambientes abafados ou falta de ventilação impedem esse processo, elevando a temperatura e aumentando o risco de explosão. Casos como queimaduras e incêndios domésticos já foram registrados, inclusive com vítimas fatais.
O que dizem os especialistas em sono
Estudos na área da neurociência e da medicina do sono reforçam que a qualidade do sono está diretamente ligada à desconexão digital. É essencial interromper o uso do celular ao menos uma hora antes de dormir, evitar conteúdos estimulantes e manter o aparelho fora do alcance das mãos durante a noite.
Para quem usa o celular como despertador, uma dica importante é deixá-lo longe da cama. Assim, evita-se o impulso de checar notificações durante a madrugada e facilita-se o relaxamento necessário para adormecer.
Como proteger seu sono na era digital
Algumas práticas simples podem fazer grande diferença na sua qualidade de vida:
- Ative o modo noturno ou filtros de luz azul no celular.
- Programe o modo “Não Perturbe” para as horas de descanso.
- Desligue o aparelho ou deixe-o em outro cômodo à noite.
- Crie uma rotina de higiene do sono: luzes baixas, silêncio e relaxamento longe das telas.
- Troque o celular por um despertador convencional, especialmente para crianças e adolescentes.
Caso a dificuldade para dormir persista, pode ser necessário procurar ajuda médica. A terapia cognitivo-comportamental é uma das abordagens mais eficazes para tratar distúrbios do sono. O SUS também oferece atendimento especializado em diversos ambulatórios pelo Brasil.
Referências científicas consultadas:
- International Agency for Research on Cancer (IARC) – Classificação da radiofrequência como possível agente cancerígeno.
- Harvard Medical School – Estudo sobre efeitos da luz azul no sono e na produção de melatonina.
- World Health Organization (WHO) – Guidelines on Electromagnetic Fields and Health.
- INTERPHONE Study – Estudo internacional sobre uso de celulares e risco de câncer cerebral.
- Sleep Research Society – Impactos da exposição à tela na higiene do sono.
- National Institutes of Health (NIH) – Efeitos do uso de eletrônicos no comportamento e saúde mental.
- American Psychological Association (APA) – Transtornos relacionados ao uso de telas, como nomofobia.
- Estudos de caso sobre acidentes com superaquecimento de celulares em ambiente doméstico.