Vícios, perdas financeiras, impactos psicológicos – esses são alguns dos perigos que vivem nos “bastidores” das apostas online. Para entender melhor o tema, o Portal A Teia entrevistou a psicopedagoga, psicanalista e terapeuta integrativa, Carine Souto, e o economista e vice-presidente do Corecon-BA, Edval Landulfo. Os especialistas discutiram os fatores que levam as apostas desenfreadas; as consequências; as medidas para prevenção e possíveis estratégias para ajudar quem enfrenta esse problema.

Como nasce o vício em apostas?

Segundo a psicopedagoga Carine Souto, o vício em apostas online frequentemente surge de uma combinação de fatores psicológicos, sociais e neurológicos. Os jogos oferecem uma recompensa instantânea e aleatória, acionando o sistema de recompensa do cérebro e liberando dopamina, o que gera uma sensação de prazer imediato. “Esse prazer contínuo e descontrolado leva à perda de controle e à dependência”, explica Carine.

Além disso, um histórico familiar de vícios ou traumas pode aumentar a predisposição ao desenvolvimento de comportamentos compulsivos. “Ambientes propícios a compulsões e jogos aumentam a vulnerabilidade”, ressalta Carine.

Os sinais de alerta para o problema incluem:

  • Tentativas frustradas de parar de jogar;
  • Problemas financeiros crescentes;
  • Irritação, ansiedade e isolamento social.

Carine destaca que pessoas em busca de alívio emocional, com altos níveis de estresse ou transtornos como ansiedade e depressão, tendem a usar os jogos como uma forma de escape. “A impulsividade e a crença ilusória de controle sobre o resultado dos jogos fazem com que mesmo após perdas recorrentes, as pessoas continuem apostando acreditando em uma grande vitória futura”, conclui.

A importância da educação financeira

O economista Edval Landulfo aponta que a falta de educação financeira contribui para o endividamento das pessoas com apostas. “Apostadores muitas vezes veem esses jogos como uma forma de investimento ou solução para problemas financeiros, o que é extremamente perigoso”, disse. Ele ressalta a necessidade de educar as pessoas sobre o uso consciente do dinheiro, a fim de evitar que recorram a empréstimos para sustentar as apostas.

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Edval recomenda que, se a pessoa quiser apostar, use uma fração mínima de sua renda, por exemplo, 0,1% ou 0,2%. “O problema surge quando as apostas começam a comprometer o orçamento financeiro, gerando uma espiral de dívidas”, conta.

Políticas públicas e a regulação do setor

Edval critica a regulação do mercado de apostas no Brasil, que visa apenas à arrecadação de impostos sem considerar os impactos sociais. “Países como Noruega, China e Reino Unido enfrentaram grandes problemas de saúde pública relacionados ao vício em apostas. Precisamos de intervenções governamentais que protejam a sociedade, não apenas regulando o mercado, mas também oferecendo suporte para quem é afetado”, destaca.

Estratégias para superar o vício

Carine recomenda terapias como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) para ajudar as pessoas a reconhecer e modificar crenças distorcidas.

“A TCC ensina técnicas para gerenciar o desejo de apostar, além de intervenções como técnicas de relaxamento e terapias integrativas para lidar com a ansiedade e o estresse”, esclarece. Ela também destaca a importância do apoio social: “O diálogo aberto com amigos e familiares pode ajudar a reduzir a vergonha e a culpa associadas ao vício, favorecendo a recuperação”, complementa.

Formas de prevenção, especialmente para jovens

Com a crescente exposição dos jovens à tecnologia, Carine sugere alternativas de lazer que não envolvam unicamente o uso de dispositivos eletrônicos. “Hábitos como leitura e o contato com a natureza são enriquecedoras alternativas ao uso excessivo da internet”, argumenta. Edval complementa, frisando a necessidade de uma abordagem preventiva.

“O governo precisa implementar ações educativas e de conscientização para mostrar que apostas não são um “investimento seguro”, (e sim, um entretenimento com alternativas de ganho e perdas). Isso deve ser parte de uma cultura financeira que incentive o planejamento a curto, médio e longo prazos. É preciso proteger as pessoas, especialmente aquelas mais vulneráveis aos efeitos negativos das apostas”, finaliza.