O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou nesta semana um plano interministerial para regulamentar o uso medicinal da cannabis no Brasil. A iniciativa foi protocolada pela Advocacia Geral da União (AGU) em resposta à decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, em novembro de 2024, determinou a regulamentação do cultivo e da produção nacional de medicamentos derivados da planta.

O documento, elaborado em conjunto com a Anvisa e os ministérios da Saúde, Justiça, Agricultura e Desenvolvimento Agrário, deve ser publicado até setembro deste ano. A normativa prevê regras para todas as etapas do processo, desde o cultivo até a distribuição dos medicamentos, ressaltando a urgência em ampliar o acesso aos tratamentos com base na cannabis.

Leia também: Acupuntura médica mostra eficácia contra dores nas costas, ombros e joelhos

A iniciativa pode ampliar o acesso ao medicamento, inclusive pelo SUS, no momento em que a utilização da cannabis para fins medicinais tem ganhado destaque no cenário brasileiro. Esse uso é impulsionado por evidências científicas que apontam seus benefícios no tratamento de diversas condições de saúde. Médicos de renome, como o infectologista Roberto Badaró, prescrevem o medicamento para pacientes buscando fins terapêuticos para determinadas condições.

Ele é categórico ao afirmar a necessidade de separar o uso da cannabis medicinal e a utilizada com finalidades tóxicas, que possuem altos níveis de THC. “Um é o óleo da cannabis sativa, que não tem ação em sistema de ação central especificamente, e o outro é o THC. Esse sim tem ação no sistema de ação central e que causa o efeito neurológico que as pessoas utilizam de forma recreativa”, pontua.

Badaró explica ainda para quais condições a cannabis medicinal pode ser usada de forma terapêutica. “Pacientes com doenças neurosensoriais, com insônias graves, porque ajuda muito na indução do sono. São indicações, sobretudo, para doenças neurológicas”, reforça.

Ainda segundo o médico, nos Estados Unidos, em indivíduos que tiveram Covid-19, a cannabis está sendo explorada como regeneração de força muscular.

No entanto, a regulamentação e os desafios associados ao seu uso ainda são temas de intenso debate.

Estudos internacionais têm demonstrado que os compostos da cannabis, como o THC e o CBD, possuem propriedades terapêuticas eficazes no tratamento de condições como epilepsia refratária, esclerose múltipla e dores crônicas.

No Brasil, pacientes têm relatado melhorias significativas em sua qualidade de vida ao utilizar produtos à base de cannabis para tratar condições como insônia e ansiedade.

Badaró alerta, porém, que existem estudos mostrando que as pessoas que utilizam doses superiores às doses recomendadas, podem adquirir uma dependência. “É como, por exemplo, o consumo de bebida alcoólica, ou vício em nicotina. Se o paciente continuar utilizando o canabidiol todo dia fora da prescrição, ele fica dependente, e quando não toma, sente falta. É por isso que tem que ser prescrito e controlado pelo médico e controlado pelo médico”, afirmou.

Resolução da Anvisa

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) implementou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 327/2019, que estabelece critérios para a fabricação, importação e comercialização de produtos à base de cannabis em farmácias, mediante prescrição médica. Essa medida visa garantir a qualidade e segurança dos produtos disponíveis no mercado nacional.

Além disso, o Conselho Nacional de Política sobre Drogas (Conad) recomendou, em dezembro de 2024, a regulamentação urgente da cannabis para fins medicinais e científicos, bem como do cânhamo para fins industriais. Essa recomendação destaca a necessidade de uma abordagem coordenada entre diferentes órgãos governamentais para estabelecer diretrizes claras sobre o cultivo e uso da planta.

Apesar dos avanços, o Brasil ainda enfrenta desafios significativos na regulamentação da cannabis medicinal. A produção nacional permanece limitada, e muitos pacientes dependem da importação de produtos, o que eleva os custos e restringe o acesso. A ausência de cultivo regulamentado no país também impede a redução de preços e a independência do mercado nacional.